sábado, 13 de novembro de 2010

Terremoto

Acordo assustada no meio da madrugada. O que é que balança? Minhas pernas? Meu peito? Meu corpo? O mundo balança. E o prédio. O prédio dança no ar ao som da música do cimento em movimento. Inclina-se ele, de um lado para o outro. Livre. Do alto, do 19o. andar, o balé é intenso e joga tudo no chão. Primeiro meu corpo, e depois a televisão no meu pé. A dor me descongela. E agora?

“Vai desabar!”. Alguém grita dentro de mim com o som da minha voz. A música aumenta de ritmo, a dança se acelera, capturo o exato momento em que uma rachadura se faz na parede do apartamento impecável e em minha pele. Minha eternidade escoa por ela em questão de segundos.

“Esta tudo bem?” Ele diz e me ajuda a empurrar a televisão.  “Vem!” E vamos os dois para debaixo da mesa do quarto. Minha nova pele mortal toca essa pele dele conhecida de anos pela primeira vez.  E a ama. Ama com esse outro amor que nunca antes.  Real. Eterno. “Eu te amo” digo em silêncio. “Eu sei. Eu também” diz ele em voz alta.

E à medida que o tempo passa e as rachaduras aumentam, nenhum dos dois tem coragem de anunciar o descolamento final: o do prédio e o de nós dois.  Voaremos daqui a pouco. Por enquanto, existimos. O silêncio vem. Vem e abraça esse corpo inquieto, agitado, que não o admite.  Instaura-se lá, plantado em mim.  Choro, choro, choro. 

E então, absorvo todo o vazio do mundo.  O que sou agora que tenho a certeza? O que sei do nunca mais? Revisito o passado e as minhas esperas. A vida que não começava. Desespero e incredulidade se alternam.  Decido me entregar, deixar essa certeza se apoderar de mim. As rachaduras, a televisão no chão e o silêncio vão se tornando eu mesma.   
                                                                                                                                                  
Dou-me conta do que sinto por ele: meu corpo mortal é capaz de gerar eternidade. “Eu te amo!”. Digo em alto e bom som. E o vazio vai se dissipando como névoa em mim. “Já posso voar” penso no exato segundo em que a dança termina.

Ainda estou viva. Por ora. 

Um comentário:

  1. Adorei! Não sei porque, mas me identifiquei com a história :) Sentimentos e emoções muito bem transcritos em palavras! Beijos!

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